A desinformação por de trás da visualização de dados

Aqui no LabVis compartilhamos muitas visualizações que são referências, exemplos de como fazer trabalhos eficientes de design da informação. Entretanto, para além das boas práticas, parte de criar um bom projeto é também estar muito atento ao que não fazer. O site WTF Visualizations contribui bastante com essa premissa. Sem delongas, a página oferece uma variada curadoria de visualizações de dados terrivelmente falhas.

O site traz gráficos problemáticos como este, sobre o número de mortes e o comportamento dos países em relação à pandemia, que fazem o leitor sair com mais perguntas do que respostas.

Os erros dos gráficos se dão pelos mais diversos motivos: falta de atenção ou de entendimento dos dados e desconhecimento dos recursos visuais são algumas das situações possíveis. No entanto, grande parte desses equívocos não é ocasionado acidentalmente. Infelizmente, muitas das visualizações do site WTF acontecem por falta de ética: gráficos criados por pessoas que sabem exatamente o que estão fazendo e se utilizam dos dados e dos recursos visuais que dominam para mostrar a verdade que lhes convém, induzindo o leitor ao erro. 

São cada vez mais recorrentes as visualizações de dados na mídia tradicional e nas redes sociais. Essa popularidade, entretanto, não foi acompanhada de uma alfabetização gráfica da população. Assim, essa combinação assimétrica acaba favorecendo visualizações mal intencionadas que se aproveitam da pressa e da falta de contato da população com gráficos para confirmar sua própria verdade.

Se engana quem acha que a prática é realizada apenas por pequenos influenciadores da internet. Esse design antiético vem sendo usado em grande escala, incluindo pessoas públicas influentes e até órgãos governamentais.

Entre os “erros” mais comuns estão mudar a linha do tempo de forma conveniente, mostrando só o que corrobora para a intenção do autor, adicionar dados extras e desnecessários para ocultar uma verdade incômoda, fazer gráficos de barras de tamanhos equivocados ou até mudar os números. Assim, os gráficos se usam da confiabilidade que o público tem nos dados para consolidar a mensagem que o criador deseja disseminar.

A curadoria do WTF Visualizations certamente não sofre com falta de conteúdo para suas publicações. Com o advento da pandemia da COVID-19 e o crescimento das fakes news, as visualizações enganosas vêm alcançando uma popularidade perigosa. A problemática vai além de “visualizações feias”: promove a disseminação de informações falsas, a descrença do público na Ciência e uma radicalização e polarização cada vez maior da população.

Neste exemplo, vemos uma mudança nas proporções das barras do gráfico. O tamanho das barras, que não condiz com os dados, acaba contribuindo para a desinformação.

Outro combustível para o site são as eleições. É visível, assim que se entra na página, a quantidade de campanhas de candidatos (inclusive brasileiros) que fazem uso de gráficos com proporções equivocadas a fim de influenciar os eleitores a seu favor. Aproveitando-se da relação de imediatismo que o público tem com a imagem, os gráficos se preocupam mais com suas capacidades persuasivas do que com a precisão no tratamento visual dos dados.

Neste exemplo, a desproporcionalidade entre o tamanho das barras é um recurso visível para induzir o leitor ao erro.
Extremamente criticada pelo público, esta campanha foi retirada do ar por infringir, de diversas e evidentes maneiras, os princípios de qualquer visualização de dados.

Assim, o site, que pode ser muito engraçado e educativo, também traz à luz reflexões éticas muito importantes. Quais são nossas responsabilidades como designers da informação? Como trabalhar os dados de forma a não induzir o leitor ao nosso ponto de vista mas, ao invés disso, fazê-lo compreender os números e chegar às suas próprias conclusões? O foco é informar o público ou simplesmente fazer propaganda?

Alberto Cairo, autor do livro How Charts Lie, defende a necessidade de uma alfabetização gráfica e numérica da população, argumentando que ler e entender gráficos deveria ser parte do currículo escolar. O gráfico, diz ele, é um argumento visual e, portanto, deve ser lido – algo que não costuma ser feito por grande parte do público, que enxerga a visualização como algo ilustrativo. Observando as publicações do WTF Visualizations é fácil entender a urgência de mudar esse padrão. Mas como democratizar essa linguagem?

A visualização de dados, como linguagem, possui capacidades retóricas que são, muitas vezes, invisíveis. Isso lhe confere poder, o que pode ser utilizado de forma bem ou mal intencionada. Nessa perspectiva, devemos refletir quais são as nossas responsabilidades como designers e como podemos, por meio da visualização de dados, contribuir para uma sociedade mais bem informada.