Partituras imagéticas: o texto musical em forma de imagem

Na pesquisa de mestrado em Artes Visuais, desenvolvida junto ao LABVIS/UFRJ, Dandara Dantas se dedicou a experimentar uma poética de tradução de partituras musicais em novas configurações imagéticas. O que motivou essa investigação foi o fato de as partituras não terem a intenção de transmitir a sensibilização da experiência musical. Pois, apesar de representações visuais da música (acessíveis pela visão), as partituras na verdade têm a intenção de dar instruções precisas de como tocar uma peça. Para isso, seus desenhos foram desenvolvidos e convencionados de modo a facilitar essa decodificação. Portanto, trata-se de uma linguagem textual com intenção objetivamente de informar  e, por isso, não consiste em uma tradução sensível da música.

Minueto nº2, Bach, em texto
Minueto nº2, Bach, em texto

Pensando em construir essa nova imagem em uma analogia visual com a música, foi definido que a percepção musical deveria orientar a construção das imagens. Dessa maneira, se evitaria um mapeamento arbitrário, preocupado apenas com um belo resultado visual. Nesta pesquisa, portanto, o próprio processo de mapeamento a partir do diálogo subjetivo entre música e imagem seria justamente a força poética do trabalho. Para pesquisar correspondências entre música e imagem para remapear as partituras, foram utilizados pensadores da imagem como Vilém Flusser e Lev Manovich e filósofos que tratam da percepção musical como José Miguel Wisnik e Walter Gomide segundo um viés fenomenológico (ou seja, fora de uma análise física da música, como uma onda, mas concentrando-se em seu impacto subjetivo).

Assim, algumas características como a liberdade de apreensão, sensação de tempo subjetivo e não-linear, a permanência da pausa (para gerar o contraste entre som e silêncio) e o efeito de presença da música, sobretudo da harmonia do piano (que permite tocar sons simultaneamente), serviram de diretrizes para o desenvolvimento das imagens. Com base nisso, foi criado um código manual para transpor os dados para uma imagem circular sem a intenção de proporcionar a decodificação desses dados. Portanto, essas imagens para fins de sensibilização, tal qual a imersão musical, têm caráter subjetivo e não linear.

Minueto nº2, Bach, em imagem
Minueto nº2, Bach, em imagem

Para colorir esses mapas musicais, foi definido um mapeamento cognitivo com a seguinte metodologia: após tocar a peça e ainda sob efeito da música, eram fotografadas cores e texturas que me remetessem à música. Essas fotografias eram utilizadas para preencher as forma das imagens criadas. Eis aqui algumas combinações cromáticas da partitura acima:

Mapa minueto

Além de traduzir texto em imagens musicais, a pesquisa obteve outros desdobramentos. Com as imagens digitalizadas, foi possível por exemplo produzi-las em camadas diferentes e assim construir esculturas.

minueto-escultura

Com isso, além de mapear representações de textos em imagens musicais, foi possível trabalhar os dados das partituras em diversas dimensões: na unidimensionalidade do texto, na bidimensionalidade da imagem, na zero dimensionalidade das imagens técnicas (virtuais) e na tridimensionalidade das esculturas.

Além disso, percebi que algumas imagens de flores se assemelhavam às imagens geradas. Com isso, foi possível utilizar tais imagens como in put para o código criado na pesquisa e assim gerar partituras. Dessa forma, fez-se a tradução inversa: da imagem (de flores) gerou-se música.

Input

crisantemo

Output

Basic RGB

Música da partitura gerada a partir da imagem da flor:

Por fim, foi desenvolvida uma performance audiovisual para simular uma maneira de criar música a partir das imagens produzidas. Através de movimentos circenses em cima de uma lira acrobática, o corpo tocava a projeção e fazia soar o som mapeado naquela área da imagem. Assim, “piano_hoop” se tornou uma espécie de piano virtual que mistura música, imagem e acrobacia aérea.